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DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO E REAJUSTE DE CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Tipo de Trabalho 

Artigo

 

DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO E REAJUSTE DE CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

 

Angelo Costa Jordão de Vasconcelos[1]

 

Sumário – Introdução. 1. Desenvolvimento. 1.1. Do Princípio da Legalidade. 1.2. Da Possibilidade de Revisão e Reajute de Contratos Administrativos. Efetivos. Conclusão. Referências bibliográficas.

 

RESUMO

O presente artigo tem como escopo averiguar a possibilidade de os valores de um contrato administrativo serem reajustados ou revistos. Muito embora o princípio da autonomia da vontade esteja presente em todos os contratos, nos contratos administrativos a Administração Pública e o outro contratante devem respeitar também o princípio da legalidade.

Destarte, restará demonstrado que somente será possível o reajuste ou revisão do valor pactuado no contrato administrativo quando a lei permitir.

Palavras-chave:  Princípio da Legalidade. Contrato Administrativo. Reajuste e Revisão.

 

 

  

INTRODUÇÃO

            É consabido que a Administração Pública somente pode atuar segundo os ditames da Lei. Não é possível ao agente público dispor sobre assuntos públicos segundo a própria vontade, caso esta não esteja conforme o disposto na legislação.

            Não é diferente na hipótese de reajuste de valores nos contratos administrativos. A Lei 8.666/93 dispõe sobre as causas as quais permitem ao administrador alterar os valores pactuados em contrato, mediante aplicação do instituto da revisão ou reajuste, quais sejam: fato do príncipe, fato da administração, interferências imprevistas, caso fortuito e força maior.

Por outro lado, o reajuste deve ser previamente pactuado para regular fato certo, como a inflação. Aqui serão estudados ambos os institutos: revisão e reajuste.

1. DESENVOLVIMENTO

1.1. DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

A Administração Pública é regida pelo princípio da legalidade, nos termos do art. 37 da Constituição Federal, funcionando este postulado como norte para a prática de atos administrativos por parte do Poder Público, ao contrário do que ocorre na esfera privada, na qual ao particular é permitido fazer tudo que não esteja vedado em lei. Ora in verbis o citado art. da Carta Magna:

 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 

 

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello[2]:

 

"o princípio da Legalidade é específico do Estado de Direito, é justamente aquele que o qualifica e que lhe dá identidade própria, por isso considerado é basilar para o Regime jurídico-administrativo".

 

No mesmo sentido, conforme Marçal Justen Filho[3],

 

"O princípio da legalidade está abrangido na concepção de democracia republicana. Significa a supremacia da lei (expressão que abrange a Constituição), de modo que a atividade administrativa encontra na lei seu fundamento e seu limite de validade".

           

A Constituição Federal outorgou à União a competência privativa para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos, nos termos do art. 22, XXVII, senão vejamos:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III;  

 

Tal competência privativa para legislar foi exercida e foi editada a lei nº 8.666/93, ato normativo que trouxe as normas gerais sobre licitações e contratos, regulando tanto o processo licitatório quanto os requisitos e pressupostos para a devida formalização do contrato administrativo. Segue transcrito o art. 1º da Lei 8.666/93.

 

“Art. 1º.  Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”

 

Destarte, a partir da vigência da Lei nº 8.666/93, foi estabelecida normas que se coadunam com o postulado da supremacia do interesse da Administração Pública, com a previsão das denominadas cláusulas exorbitantes, pelas quais o Poder Público pode, v.g., rescindir o contrato de maneira unilateral ou até aplicar sanções ao contratado. De outra banda, também foram editados dispositivos legais prevendo regras sobre as cláusulas contratuais nas quais são facultadas a modificação de forma bilateral.

 

Não estão entre as cláusulas regidas pelo poder extroverso da Administração Pública as cláusulas contratuais pactuadas para manter o equilíbrio econômico-financeiro, com o escopo de preservar os preços acordado quando da celebração do ajuste. Eis a transcrição do art. 65, “d”, inciso II, da Lei 8.666/93:

 

Art. 65.  Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

 

II - por acordo das partes:

 

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.”

 

Tendo em vista os acontecimentos imprevisíveis capazes de alterar cláusulas contratuais financeiras, a doutrina aponta institutos diversos com características própria com o escopo de regular a situação hipotética causa de aplicação, entre elas: a correção monetária, o reajustamento e a revisão.

 

A correção monetária resume-se a mera atualização do valor da moeda, situação que não enseja celeumas, descabida a necessidade de estar previsto no edital ou no contrato administrativo, uma vez que não gera majoração dos custos.

 

Por outro lado, a revisão busca recompor o equilíbrio financeiro do contrato, seja por ato modificado emanado pela própria Administração Pública, v.g., quando necessita de acréscimo ou supressão quantitativa ou qualitativa, permitido no contrato administrativo, seja quando configurada álea extraordinária. Eis um breve resumo dos fatos ensejadores da aplicação da revisão das cláusulas financeiras do contrato:

 

  • Fato do príncipe: Atuação geral e abstrata do Poder Público, acarretando onerosidade excessiva, ainda que não impeça o objeto principal. Atinge o contrato de forma indireta e reflexa.
  • Fato da Administração: Atuação específica do Poder Público, atingindo o contrato de forma direta, apenas.
  • Interferências imprevistas: Situação existente desde a celebração do contrato, mas que só pode ser averiguada quando de sua execução.
  • Caso fortuito e força maior: Eventos imprevisíveis e inevitáveis que impedem ou tornam extraordinariamente onerosa a execução do contrato.

 

Segundo José dos Santos Carvalho Filho[4]:

 

“A revisão dos preços, embora também objetive o equilíbrio contratual, tem contorno diverso. Enquanto o reajuste já é prefixado pelas partes para neutralizar um fato certo, a inflação, a revisão deriva da ocorrência de um fato superveniente, apenas suposto (mas não conhecido) pelos contratantes, quando firma o ajuste.”

 

O reajuste, por outro lado, é regulado pelo inciso III, do art. 55, da lei nº 8.666/93 e tem como escopo evitar os efeitos inflacionários incidentes nos preços de mercado em um determinado intervalo de tempo. Eis os dispositivos legais pertinentes:

 

Art. 55.  São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

 

Trocando em miúdos, a principal distinção entre os institutos, especificamente entre a revisão e o reajuste é o fato que aquela relaciona-se a um acontecimento não previsto, ao contrário do reajuste, quando os celebrantes se previnem quanto a acontecimento certo, prevenindo-se contra o desequilíbrio contratual.

 

Ademais, difere-se também pelo fato de o reajuste, de característica preventiva, deve estar previsto expressamente tanto no edital de licitação quanto no contrato administrativo pactuado, enquanto que a revisão, decorrente de fato incerto não necessita de previsão contratual.

 

Nesse diapasão, novamente seguem as palavras de José dos Santos Carvalho Filho[5]:

 

“Sensível a essa realidade, o legislador inseriu, entre as cláusulas necessárias do contrato administrativo, “o preço e as condições de pagamento, e quando for o caso os critérios de reajustamento’ (art. 55, inciso III, do Estatuto). É bom que se diga, porém, que deve ser expressa a avença nesse sentido, razão por que, sem ela, entende-se que o preço ajustado é fixo e irreajustável.”

 

Em outras palavras, o reajuste tem a função de prevenir os efeitos inflacionários antes que afetem o equilíbrio financeiro do contrato administrativo. Para ser aplicável, necessário que haja a sua previsão contratual expressa. Na hipótese de ausência de tal cláusula, o contrato permanecerá sem reajuste até o termo.

 

Forçoso repetir: caso edital e contrato não preverem cláusula de reajuste, permanecerá irreajustável até o fim da avença. A matéria está no âmbito dos direitos disponíveis das partes. Contudo, a inflação é previsível, restando vedado invocar a teoria da imprevisão com o escopo de reajustar o valor do contrato.

 

Ademais, os pactuantes antes de firmarem o contrato tomam conhecimento tanto da minuta do edital quanto da minuta do contrato. Violaria até o princípio da boa-fé objetiva pleitear reajuste contratual sem previsão expressa no contrato. Nesta situação, um hipotético deferimento do reajuste violaria vários princípios constitucionais e administrativos, mormente os princípios da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório.

 

Nesse diapasão, segue aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

 

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – CONTRATO ADMINISTRATIVO – REAJUSTE DE PREÇOS – AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO CONTRATUAL – DESCABIMENTO.

1. O reajuste do contrato administrativo é conduta autorizada por lei e convencionada entre as partes contratantes que tem por escopo manter o equilíbrio financeiro do contrato;

2. Ausente previsão contratual, resta inviabilizado o pretendido reajustamento do contrato administrativo;

3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido.

(Processo: REsp 730568 SP 2005/0036315-8. Relator (a): Ministra ELIANA CALMON. Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA. Publicação: DJ 26/09/2007 p. 202)

 

Trocando em miúdos, eis os seguintes institutos que permitem a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo: a) correção monetária. É a simples atualização da moeda, não alterando o custo e não precisa estar previsto no contrato; b) reajustamento dos preços. É o aumento de preços já previsto no contrato (fórmula preventiva) e deve estar previsto no contrato; c) recomposição/revisão de preços. É o aumento do custo que não está previsto no contrato. Teoria da imprevisão, decorre da lei (direito subjetivo do contratante), independe, portanto, de previsão contratual.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONCLUSÃO

 

Conclui-se, destarte, que para que o ato administrativo que conceda o reajuste contratual em razão de perdas inflacionárias, mister se faz que cláusula expressa esteja prevista tanto no edital quanto no contrato administrativo.

 

Para a revisão da cláusula financeira, basta que aconteça algum evento imprevisível dentre os elencados na legislação para possibilitar acréscimo do valor contratual, sendo despicienda previsão no edital ou no contrato.

 

Todo o alegado coaduna-se com o ordenamento jurídico pátrio, sobretudo nos dispositivos no do art. 37, bem como no inciso III, do art. 55 e no art. 65, da lei nº 8.666/93 e na uníssona jurisprudência dos tribunais superiores.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Referências bibliográficas

 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. Ed. São Paulo: Lumen Juris, 2012.

 

JUSTEN FILHO,Marçal- Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Forum, 4ª ed. 2009

 

MELLO,Celso Antonio Bandeira de- Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros,26ª ed. 2009

 

 

[1]          Advogado, Procurador do Município de Igarassu - PE, graduado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp.

[2] MELLO,Celso Antonio Bandeira de- Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros,26ª ed. 2009

[3] JUSTEN FILHO,Marçal- Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Forum, 4ª ed. 2009

[4] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. Ed. São Paulo: Lumen Juris, 2012.

 

[5] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. Ed. São Paulo: Lumen Juris, 2012.